sábado, 26 de março de 2011

Outono em nós



Buscou firmemente pelas lembranças que carregara como uma espécie de amuleto e, incrédula, constatou: já não sofria mais. Nutria há anos um desejo não tão secreto de vingança. Desejava ardentemente que seus desafetos vivessem  muito para que a vida tivesse tempo de castigá-los, como deveria ser e como esperava que fosse. Ao mesmo tempo lhe ocorria a culpa por pensar dessa forma, para tão logo se aferrar na sua antiga dor. Possuiam uma dívida com ela e pagariam por isso.

Sofrera com bravura  sem deixar que isso interferisse na sua vida, pelo menos na parte material, pois na sentimental não podia afirmar o mesmo. Colecionara neste meio tempo uma sucessão de romances fracassados e a cada tentativa, tão se iniciava, já previa o desastre que seria. 

Andava tão alheia dos sentimentos negativos que não percebera que havia mudado o foco, largara a dívida nas mãos do destino, apesar da incerteza se ele existia. Depois de algum tempo acordou para o que realmente deveria ter lhe interessado desde o princípio: o seu amor próprio. Percebera que havia perdido muito tempo atribuindo a sua infelicidade a alheios enquanto que a mudança de perspectiva deveria ter vindo dela própria. 

Acordara mudada, não havia dúvida. Mas não pense que foi como um passe mágica, apenas desistiu de persistir no erro. Responsabilizou-se pela sua felicidade ou infelicidade, tomou as rédeas de sua vida sem atribuir esta tarefa a terceiros. 

Acordada desde muito cedo resolveu levantar, abriu a janela e sentiu o ar de outono invadir o quarto, as folhas das árvores caídas na grama denunciavam a renovação da natureza, finalmente concluiu que tal qual as folhas era chegada a hora de se renovar e jogar no solo velhas mágoas. A natureza, o tempo, a vida se encarregariam de tudo e ela não relutaria.    



Observação: este texto não é auto-biográfico.




Sandra Lopes - 26/03/2011





   

2 comentários:

  1. O tempo cura, pode demorar, 1, 2, 3 ou 4 anos, mas cura.E vingança é um prato que se come frio, e o destino se encarrega de tudo...

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  2. Seu amor proprio... é o que cativa, na simplicidade das palavras, sabes encantar com seu sorriso meigo... sou teu fã...um apaixonado...

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